segunda-feira, 19 de setembro de 2016

em outros embalos
eu até gingo e tropeço
mas só com você
sei dançar no ritmo certo

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Ensaio sobre a liberdade de amar.

       

  Liberdade e amor. Talvez sejam essas as aspirações mais desejadas pela humanidade. Ainda que nas formas mais perversas, ou se quer ser livre ou se quer amar e ser amado. O dinheiro dá liberdade (mesmo que falsa), o poder nos dá sensação de sermos amados (ainda que não seja amor verdadeiro). Mas são também esses os sentimentos mais distantes de serem compreendidos e plenamente alcançados, durante tantos séculos de busca, sempre pesaram sob nós os grilhões da tradição, da moralidade, dos valores baseados na propriedade e nas relações de produção, mas ainda assim encontramos quem se esforce para romper as correntes e voar rumo ao infinito onde não haverá limitações sobre amar e ser livre.

Ser livre, amar e ser amado são condições que perpassam muitos dos aspectos da vida e das relações humanas, dentre eles as relações sexuais e afetivas. Esse seja talvez um dos principais elementos da felicidade humana, pois combate um dos maiores males que nos pode afetar: a solidão; e assim através da companhia nos dá o prazer daquilo que torna as coisas da vida e da natureza mais belas: o compartilhamento. E isso poderá estar imerso numa boa dose de afeto, prazer, carinho e tesão, atributos que dão sentido à beleza de se viver, e vivendo, de sentir.

Mas obviamente, mesmo nossos desejos mais puros, os elementos mais belos dos sentidos e da natureza tendem a ser regulados, nas relações humanas, pelas condições históricas e sociais. Por isso desenvolveu se uma determinada forma de amar e ser amado. A história da família e da propriedade bem explicam como se chegou ao domínio moral e cultural da monogamia no ocidente, como se arrasou a possibilidade da liberdade no amor e se enquadrou em paredes quase intransponíveis a forma com que os homens e mulheres deveriam se relacionar.

Houveram tempos em que essas paredes não existiam, em outras ocasiões talvez fossem paredes em outros formatos. Mas o fato é que há séculos estamos enclausurados nessa forma quadrada de amar. Aos poucos vão surgindo novas possibilidades, novas experimentações e diferentes formas de se relacionar. Infelizmente o concreto que dá suporte às paredes que nos esmagam são fortes demais para que a sociedade reconheça o amor em sua essência, e estreitas o suficiente para que nós mesmos, que queremos rompê-las, tenhamos dificuldades em saber por onde sair.

Mas de uma maneira ou de outra, a gente se aperta, chega pra lá, volta, para, vai em frente e aos poucos vai se libertando dessa maldição. Assim eu pude chegar a algumas conclusões: o amor é múltiplo e fluído, tem significados transcendentais e só pode se exercer por completo se assim estiver acompanhado da liberdade.

A solidão é a antítese. A busca pela companhia é a tese. O relacionamento é a síntese. Durante muito tempo não consegui compreender que diáletica não é o mesmo que dualidade. É justamente a mudança, é o sólido que se desmancha, é o todo e não o específico. São as múltiplas possibilidades. Será possível amar várias pessoas? E distribuir sua atenção, seu afeto, sua sinceridade a todas elas? É inexplicável, intangível. Por isso o amor é fluído e transcendental, por isso não pode ser classificado, não pode ser alcançado, só pode ser sentido, de múltiplas maneiras. É atemporal, vai e vem, é e depois não é, e um dia muda. Não tem espaço, ultrapassa qualquer lugar.

Mas ainda assim existe a solidão. O que é o ciúme se não o medo de ser abandonado e uma forma instintiva de se proteger. A vontade de a cada momento querer sentir provado o afeto por ti, o querer ser único, fazer a diferença e ser buscado por alguém. Quem de nós não quer ser lembrado por outra pessoa como alguém indispensável? Mas ser único, talvez não seja ser exclusivo. E pode até ser que se queira exclusividade. Mas e depois? O futuro pode nos reservar encontros inesperados, e já não existe mais exclusividade para nós. O que se espera então daquela outra pessoa que já lhe amava?

O respeito deve ser para nós muito mais do que o orgulho. Nosso sentimento deve ser muito mais real do que o orgulho. Devemos nos permitir a sentir o que realmente queremos e sermos felizes assim. Precisamos acreditar que o valor do amor é muito maior do que o da exclusividade ou da preferência, precisamos acreditar que exista no amor várias formas de dedicação e afeto, e assim acreditar no amor que sentem por nós. E acreditar nisso é ser livre para amar sem preocupações e sem restrições e entender que ser amado é o suficiente para não estar só.

Mas amar é também compreender que o amor sempre será plural. E que amar é querer bem e é querer livre quem se ama. Por isso não se basta que o amor satisfaça só a nós mesmos, é preciso romper a barreira do egoísmo e compreender o amor e a liberdade como algo que só se atinge coletivamente e isso se trata de responsabilidade. Porque ainda que o amor e a liberdade sejam os sentimentos mais preciosos, podem também ser os mais perigosos. Então se se ama e quer ser livre é preciso ser cuidadoso, consigo e com quem ama.

O amor e a liberdade estão além do que conseguiu chegar a compreensão humana até agora. Mas é certo que cada um deva exercitar o seu amor de acordo com a sua própria liberdade e vontade, desde que compreenda sempre sua relação dialética. Assim quem sabe, pra além da afetividade, possamos cada vez mais amar a humanidade e lutar pela liberdade, sendo felizes por não estarmos sozinhos e dando sentido às nossas vidas com as emoções mais puras.

quinta-feira, 8 de setembro de 2016

A participação da imprensa brasileira no Golpe de 2016

A avaliação sobre a evolução das ferramentas de comunicação em massa e o desenvolvimento tecnológico das corporações da informação, isto é, da mídia e da imprensa, deve ser assunto fundamental para a compreensão das recentes articulações políticas que engendraram em um golpe institucional no estado democrático de direito do Brasil, ou da deposição de uma Presidenta da República por vias conspiratórias.

A imprensa, também apelidada como o Quarto Poder da República, tem o seu modus operanti próprio no Brasil, o tamanho poder desregulado que aqui ela concentra é motivo de curiosidade para todo o resto do mundo, onde os meios de comunicação têm sido cada vez mais regulamentados de acordo com a diversidade de opinião e a descentralização da informação cuja modernidade e o avanço tecnológico insistem em acelerar cada vez mais.

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Os múltiplos elementos que configuraram a trama dessa conspiração do impeachment criaram um verdadeiro Kraken (um monstro da mitologia grega, parecido com um polvo gigante com inúmeros tentáculos enormes), cujos tentáculos podem se encontrar por todos os lados e que envolvem o judiciário, o legislativo e outras corporações como a própria Polícia Federal, o Ministério Público Federal, o Supremo Tribunal Federal, o Tribunal de Contas da União e isso sem falar nos atores internacionais, do qual certamente os Estados Unidos são protagonistas. Tamanha concentração de poder faz com que a análise da construção do impeachment no Brasil tenha a imprensa também como uma integrante fundamental desse processo.

A compreensão histórica, como sempre, se faz necessária como uma ferramenta para um entendimento mais aprofundado no presente do papel de organizações que permearam os processos políticos da constituição do nosso país, justamente pela forma que se comportaram em outros momentos do passado. Nesse sentido devemos avaliar a influência imprensa em outros episódios importantes da história política do Brasil e ao mesmo tempo refletir sobre como ao longo do tempo as ferramentas e os avanços tecnológicos facilitaram ainda mais a sua participação, possibilitando inclusive que seus tentáculos e seu manto da (des)informação se estendesse por um número inimaginavelmente maior de pessoas e de uma maneira tão mais ágil quanto jamais poderíamos conceber.

Ora, há mais de 60 anos um Presidente da República já havia sentido como seria fundamental a participação da imprensa em um processo conspiratório, e a capacidade que esses meios de comunicação sempre desenvolveram de criar, manipular ou desvirtuar as informações de maneira sútil para obter fins desejados. Getúlio Vargas caiu nas garras de Lacerda e da mídia da época, que tramaram com os opositores de seu governo e conseguiram criar uma sustentação que ganhasse lastro na consciência e no imaginário popular, para que enfraquecido, o presidente fosse levado à derrota quase que por conta própria.

Resultado de imagem para imprensa brasileiraNão por falta de vontade das elites e dos militares um golpe militar foi adiado por mais 10 anos, quando em 1964 se consolidou usurpando o legítimo mandato de João Goulart. E lá estava a imprensa novamente, com condições ainda melhores para criar uma narrativa que gerasse um sentimento sine qua non aos seus objetivos. 


Nenhuma transformação política ocorre efetivamente sem que com ela existam mudanças também em outras esferas da sociedade, fundamentalmente balizadas pelas relações sócio-econômicas e de produção, mas que buscam espaço também na consciência e no imaginário popular, já que as grandes transformações exigem uma fundamental mobilização da coletividade social, isto é, das massas, e desde que esse elemento essencial não esteja convencido da mudança (ou da manutenção de um status quo) tal desejo não se alcançará, e por isso a imprensa é tão fundamental: a disputa de consciência.

Tais reflexões só podem desaguar no fatídico momento político em que vivemos, talvez num recorte mais amplo, possa se estender à Junho de 2013, onde a presença da imprensa na disputa da linha política das ruas foi nítida e escancarada. Mas passados mais de 60 anos desde o suicídio de Getúlio e mais de 50 anos desde o Golpe Militar, os aparatos tecnológicos que podem gerar e disseminar a informação são muito mais sofisticados e por isso aceleram os processos dinâmicos de transformação de paradigmas do pensamento humano.

A entrada da imprensa com mais assertividade na construção da linha política que mobilizou as pessoas às ruas e a forma com que isso se direcionou à disputa do poder foi fatal. Os grandes oligopólios de comunicação do Brasil, que muito diferente do que defende o livre-mercado, não apresentam absolutamente nenhuma chance para concorrentes, apostaram toda sua estrutura para criar uma narrativa política própria, que convencesse a população brasileira de seu próprio programa político, sem lhes apresentar outras alternativas de reflexão. E o objetivo era um só: derrotar o projeto que se instalou no centro do poder do estado brasileiro, os focos eram Lula, Dilma, o PT, a esquerda, e em grande escala todo o projeto de nacional-desenvolvimentismo progressista.

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Usaram toda sua expertise daqueles que há dezenas de anos constroem interpretações, selecionam e disseminam informações à sua própria sorte e fazem parte, obviamente, do jogo do poder, ilude-se quem acha que não. Foram sagazes. Souberam dissecar e apontar as lideranças que precisavam ser abatidas, transformaram problemas sistêmicos e históricos da política brasileira em crimes dolosos e personificados, fizeram da informação um objeto a ser olhado por um telescópio defeituoso, equívocos desvirtuados e ampliados à uma escala que deixaria qualquer um abismado. E com o monopólio da informação e todas ferramentas a seu dispor, estavam com todas as condições necessárias.

E assim foi. Disputaram e criaram uma narrativa absurdamente modelada à sua vontade, criaram um clima entre a população e inflavam a cada momento, jogavam subjetivamente às bandeiras e as análises políticas e econômicas que elaboraram, e logo as ruas estavam ocupadas ao som de suas próprias bandeiras. Esse é mais um do elo dessa longa corrente do golpe, a consciência do povo é elemento fundamental e deve ser entendido como parte do processo de construção desse absurdo que vivemos hoje e que tem respaldo entre muitas pessoas. Isso ressalta a importância de continuarmos lutando por uma comunicação mais democrática e de estarmos cada vez mais elaborando uma contra-informação que seja honesta e justa, para contestar esse projeto atrasado e elitizado apresentado pelo monopólio da imprensa.