domingo, 8 de dezembro de 2013

Futebol: violência e alienação versus identidade e lazer. - Uma discussão mais aprofundada

O jogo entre os times Vasco da Gama e Atlético-PR, que está ocorrendo hoje (08/12),assim como a rodada em geral, prometia ser emocionante(está em jogo uma vaga na libertadores e a fuga do rebaixamento), até pelo fato de seu significado ser aquilo que os esportes em geral se propõem a ser para seus espectadores: espetáculos. O futebol, é para além de um desporto, um aspecto identitário e cultural marcante na cultura do povo brasileiro, em sua maioria da parcela pobre da sociedade
. O que acaba se tornando uma forma de expressão popular, bem como de distração e lazer.

Não vejo futebol com tanto pessimismo. É preciso compreender a importância simbólica do futebol para o nosso povo. Vejo muitos comentários que tratam esse esporte como prática de alienação ou de "pão e circo", discordo radicalmente, o problema é muito mais complexo. Além do mais, querem nos privar do nosso direito ao lazer e a diversão? Que sociedade seria essa que viveriamos sem a possibilidade de ter espaços de lazer. No meu ponto de vista, uma sociedade desumanizada.

Entretanto, ainda existem grupos que se formam nesses espaços que tendem a criar o contrário do que se propõe o futebol enquanto espetáculo, e o que os próprios espectadores buscam no futebol. Tenho pouco conhecimento sobre a questão das torcidas organizadas, mas tenho grandes ressalvas.

Primeiro: não se trata
de um time ou de outro, é um fenômeno generalizado que tira o sentido real da torcida em si.

Segundo: é preciso se repensar qual o sentido e a essência desses grupos. Se por um lado são fundamentais enquanto organização da torcida e de apoio ao time, além do espetáculo que o próprio público pode proporcionar, por outro criam verdadeiras "gangues" com um espírito e tradição de enfrentamento físico e da transgressão moral, exemplificado pelas palavras de ordem (gritos de guerra) que insinuam e pedem a violência ("vou dar porrada", "vem pro pau", etc.), ou pelas atuações em grupo fora dos estádios (depredação de espaços públicos, provocações agressivas e sem sentido, etc.).

Futebol presente em momentos históricos do Brasil
Terceiro: o contato com o crime organizado. Não foram poucas as vezes que se constatou relações de torcidas organizadas com grupos de crime organizado, tráfico de drogas, etc.

O fato é que as torcidas organizadas criam um espaço que invertem sua própria lógica de existência. A criação do espetáculo, o apoio e o fomento ao esporte enquanto característica fundamental da formação cultural do povo brasileiro e como forma de inserir as classes socialmente marginalizadas em espaços de lazer são transformadas em cenas de barbárie, onde o senso de convivência, respeito mutuo e solidariedade (que são também propostas do esporte) desaparecem.

Minha avaliação é de que esse tipo de acontecimento não caracteriza o povo brasileiro em si, é um erro grotesco (quiça com um pingo de ignorância) classificar esse tipo de conflito como: "isso é o Brasil". Não é, e também não é o futebol brasileiro. Precisamos desclassificar esse tipo de ação, reprimi-las enquanto práticas, para que não se tornem comuns, ou naturalizadas.

O grande problema hoje que resultam nesse conflitos violentos e nessa inversão da lógica e da proposta do futebol-espetáculo - que é aquilo que o bom torcedor busca - são as formas com que essas torcidas organizadas se articulam, e qual é a mentalidade que renova suas práticas e agrega mais pessoas entorno de si. É necessário se discutir com mais profundidade esse tema, buscar soluções, que devem partir principalmente de questões sociais que estão presentes na formação desses grupos. Formas de transformar a mentalidade e as práticas que norteiam essas torcidas precisam ser criadas, punir os responsáveis pela violência.
Espetáculo também na torcida

E repito, muito me assusta pessoas que tentam classificar o Brasil, respaldado por esse tipo de discurso que insere fatos lamentáveis como esse na caracterização do povo brasileiro. Isso precisa ser tratado como uma exceção e não como uma regra! Nesse sentido, não deve ser essa a crítica direcionada a realização da Copa do Mundo no Brasil. Esse tipo de fato mancha nossa imagem de nação que está a meses da realização desse evento, pois deverá ser noticiada em vários cantos do mundo, e é isso que os imperialistas querem: tratar os brasileiros como selvagens e violentos.

Não podemos cair nesse discurso, ou voltaremos ao velho complexo de Vira-Lata!

Por outro lado, não há como caracterizar a Copa do Mundo a partir da atuação das torcidas organizadas nos estádios. Porque não há torcida organizada para as seleções dos países, nem mesmo para o Brasil! Não há o mínimo de condições de se fazer esse tipo de comparação, a não ser pela simplificação do argumento na tentativa de justificar o injustificável. Esse problema não se resume a "isso que é o Brasil", mas ao formato que as torcidas organizadas se inserem hoje, o que nos remete a um problema mais profundo, de cunho social, econômico, basta notar quem são os personagens que compõem essas torcidas, de que grupos sociais, em que espaços eles estão inseridos?

Estou profundamente chateado com o ocorrido desse jogo entre as torcidas. É assustador e desanimador. Mas me preocupa também a leitura e a critica superficial que muitos fizeram. Ainda tenho muito o que aprender sobre o futebol e as torcidas organizadas, mas acredito que o problema central na discussão da violência nos estádios, deve estar ligada ao formato dessas organizações, à ideologia que elas se propõem a criar e legitimam suas práticas e ao fundo social que permeia tudo isso.

Um grande abraço a todos bons apreciadores do futebol, fator marcante da cultura e da identidade brasileira, espaço de lazer e de diversão importante para nossa sociedade, mas descaracterizada pelos grupos que cometem esses atos de barbárie e violência, e superficializado pelos pessimistas.

Um comentário:

  1. Pois é...
    Precisamos rever esse negócio de torcidas organizadas. Sou defensor da catalogação de todos os integrantes. A Polícia vai com máquinas fotográficas ou filmadoras, registra tudo. Aí pega os infratores em casa ou no trabalho, e autua e obriga a assistir todos os jogos em uma Delegacia, chegando 2 horas antes e liberando 2 horas depois, ou do contrário uns tempos de prisão. A reicidência vai gerando penas mais severas.

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